quinta-feira, 2 de julho de 2009

Tapscott acredita que Portugal é exemplo para Obama - verdades e consequências

O homem inventou a politica para deixar de obedecer a outro homem, obedecendo em alternativa a uma abstracção, uma ideia de poder superior exercido em nome de um bem comum. A ciência politica explica estas coisas e explica também que a politica e as politicas precisam de homens concretos. Ou, como também já foi dito por uma das nossas mulheres de direito, Maria José Morgado, o problema não está nas leis (referia-se ao combate á corrupção ...), o problema está nos homens e mulheres que aplicam essas leis.
Eis que um dos mais interessantes pensadores da era digital escreve um artigo no seu blogue que torna esta discussão, uma vez mais, pertinente. Don Tapscott, autor de Wikinomics, Growing Up Digital e Grown Up Digital, é um apaixonado por Portugal. Começa por estar casado com uma portuguesa – o que é um bom princípio. Depois gosta de pasteis de nata e, last but not the least, gosta efectivamente do pais que conhece, sem dúvida, bem melhor que tantos outros gurus que apenas percorreram o corredor do aeroporto ao Ritz. E, dito isto, é este também o pensador que, na semana passada, recomendou a Barack Obama que colocasse os olhos em Portugal se queria ter uma visão inspiradora sobre como revolucionar a educação.

Pois ... apesar do profundo conhecimento dos temas da geração digital e inclusive de algum conhecimento efectivo sobre Portugal, existem as ideias e existem os homens, as mulheres e, neste caso, também as crianças e os jovens concretos. Os homens e as mulheres concretos que desenharam e implementaram o programa e-escola e e-escolinha e o líder desse projecto, o homem concreto que chefia o Governo português, leram os livros certos, fizeram a pesquisa certa e, sejamos também justos, tiveram a coragem de levar à prática uma série de conceitos que estavam em case-studies e manuais. E isso é bom. Mas os conceitos são os tais “parafusos mentais” que nos ajudam a montar um determinado engenho, mas não são a garantia do engenho funcionar.
Don Tapscott esteve em Portugal em Fevereiro deste ano e apresentou muito mais que “parafusos mentais”. Trouxe casos de pessoas concretas que ilustram bem o quanto mundo está a mudar e nos desafiam a pensar em formas de fazer esses ventos de mudança funcionar a nosso favor. Em particular, o caso o aluno brilhante que nunca tinha lido um livro na vida e que se preparava para fazer mestrado em Oxford deu que pensar a muitos, a mim, confesso que me impressionou particularmente.
Mas esse é o (re)conhecido poder do storytelling, da narrativa, um poder ancestral agora redescoberto como moda de gestão.
Na vida de todos os dias, a questão é saber como usar ideias fascinantes e desafiadoras como a da aprendizagem colaborativa, da aula como espaço de interacção e de criação, entre outras, em realidades efectivas que conquistem os alunos para o saber e para o conhecimento, reduzam o abandono e/ou desinteresse escolar e, mais do que isso, criem cidadãos mais aptos a usar em benefício próprio e da comunidade as “ferramentas” da era fantástica em que vivemos.
Como é que isso se faz?
Ninguém tem respostas absolutas. Estamos todos a aprender. Pessoalmente, tenho estado envolvida em diversos projectos de desenvolvimento de conteúdos para crianças e jovens e conheço bem as dificuldades. Quanto mais “tecnologia”, “conteúdo”, “plataformas”, mais difícil. É preciso escolher, testar, colocar permanentemente perguntas difíceis, estar disposto a aceitar o erro, mudar quando se erra e aceitar como regra que ... não há regra. Nesse trabalho, moroso, complexo, de formiga, os programas e-escolas e e-escolinhas não poderiam ser nunca um ponto de chegada. Serão, em justiça, um ponto de partida. Qualquer pai, educador e até mesmo uma criança de 7 anos consegue responder sem dificuldade a Tapscott que o país que ele retratou não é o mesmo em que vivem todos os dias. Mas será que não podemos concretizar esse pais? Talvez possamos todos sonhar um pouco mais, fazer um pouco mais e deixar essa propensão também tão nossa para encolher os ombros e dizer que não há nada a fazer.
Algumas mentes avisadas têm defendido que um dos problemas da educação é o facto de não ser uma obra de resultados imediatos. Não é como lançar empreitada a mais uma estrada e vê-la, meses ou na pior das hipóteses um ou dois anos depois, estar concluída e inaugurada com pompa e circunstância.
Na educação, o horizonte mínimo de trabalho é o de um ciclo completo de formação, qualquer coisa como 20 anos. São 5 legislaturas. São 5 (ou mais) estruturas dirigentes. São 20 turmas para um professor. É uma maratona. Precisamos estar dispostos a corrê-la e não faz mal começarmos com a pompa e circunstância que levar computadores a crianças pequenas sempre traz. Desde que esse seja um princípio e não um fim em si mesmo.
Vale a pena ouvir a professora Teresa Marques, que ensina Matemática e Ciências aos alunos do 5º e 6º ano e que foi em Portugal uma das percurssoras da utilização da linguagem criada no MIT, o Scratch, para que as crianças comecem desde cedo a perceber a lógica da programação e da criação digital. Pacientemente ao longo de cada ano lectivo, já vão cerca de quatro, a Teresa constrói com os seus alunos desafios e usa a máquina e a tecnologia para obter respostas e lançar novas perguntas. Acredita que o grande desafio dos professores é aprenderem mais rápido do que os alunos, pois só assim podem ajudar os alunos a também eles apreenderem mais rápido. Debate-se com os problemas de tantos professores, falta de tempo, espaço e recursos limitados, não, não é o pais do Tapscott. Mas ela está lá, todos os dias e eu bem gostava que os meus filhos estudassem com alguém assim.
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P.S. - Este vídeo é uma reportagem realizada pela minha equipa no âmbito do projecto desenvolvido para a Portugal Telecom / Portal Sapo e que consistiu na criação do Sapo Kids.

3 comentários:

Luis Caçador disse...

gostei imenso deste seu artigo. é a sonhar que crescem as crianças e o seu espaço envolvente.
Com consideração,
Luís Caçador

Rute Sousa Vasco disse...

Obrigada Luís.
Acredito profundamente nisso, sem ser assim tudo seria muito mais difícil : )

Teresa Martinho Marques disse...

Chego sempre atrasada (tenho desculpa, porque a maior fatia do meu tempo é para os meninos e para sonhar com mais e melhores coisas para eles) mas não queria deixar de agradecer as suas palavras... Doces, fortes, carinhosas. Nem sempre sentimos este apoio ou reconhecimento... verdade seja dita. :) Mas é bom recebê-lo de vez em quando... Um empurrão para diluir os cansaços...
Muito obrigada!
(Peço desculpa pelo link inactivo do twitter... tive de cortar em algumas redes para que me sobrasse mais tempo para outras coisas...

Abraço grande